RJ e Rivian: conheça o carro - e o CEO - que vão incomodar a Tesla

Você já ouviu falar de Robert Joseph Scaringe, mais conhecido entre seus pares da indústria automobilística por RJ? Pois é, até pouco tempo atrás eu também não conhecia esse nome, mas confesso que tenho ficado impressionado com a história desse americano, jovem ainda (37 anos de idade), mas com uma idéia e muitas parcerias que podem desbancar Elon Musk e o sucesso inovador da Tesla. Ou pelo menos deixar eles um pouco incomodados, para falar o mínimo.

RJ Scaringe é fundador e CEO da RIVIAN AUTOMOTIVE, uma empresa que tem por trás investidores de peso: Amazon, Ford e Cox Automotive (dono das gigantes do ramo de automóveis Autotrader e Kelley Blue Book), entre outros. E para quem achava que Elon Musk nadava de braçada nesse mundo dos veículos elétricos, cuidado: a REVIAN já tem muito trabalho contratado pela frente. 

Conheça o video que a Rivian fez para explicar a filosofia por trás do negócio clicando nesse link 

"Passamos muito tempo observando e compreendendo como as diferentes montadoras foram construídas", disse Scaringe recentemente numa longa entrevista para a Forbes. "E passamos muito tempo entendendo os riscos associados a como construir e escalar um negócio, e o capital de giro que é necessário".

Dinheiro não falta, pelo menos por enquanto

Os números iniciais que esse jovem CEO conseguiu arrecadar impressionam. Nos últimos 13 meses (de janeiro de 2019 a feveiro de 2020), ele e sua equipe levantaram US$ 2,85 bilhões para financiar o futuro da Rivian. Nada mal para quem está começando, ainda mais levando-se em conta que nesse ramo muita coisa vem mudando nos ultimos anos, e grandes empresas, já consolidadas, estão tendo que se redescobrir para não piorarem a já complicada situação onde se encontram hoje em dia.

A primeira grande investidora foi a não menos visionária Amazon de Jeff Bezos que liderou junto a outras empresas um investimento inicial de US$ 700 milhões em fevereiro de 2019. Em seguida, a Ford entrou com  US$ 500 milhões (dois meses depois). A Cox Automotive, cujas marcas incluem Autotrader e Kelley Blue Book, aportou outros US $ 350 milhões em setembro. E se isso não bastasse para turbinar as ambições da Revian e de RJ Scaringe, pouco antes da véspera de Natal, a gigante de gerenciamento financeiro T. Rowe Price liderou mais uma rodada de investimentos no valor de mais de US $ 1,3 bilhão.

Com o surgimento da Rivian, podemos dizer sem medo de errar que o mercado de veículos elétricos não é mais uma doce ilusão de jovens deslumbrados, incomodados com a emissão de carbono, que de vez em quando falam demais e fazem bobagens na gestão de seus negócios. De fato, a década de 2020 está se preparando para ser a década dos veículos elétricos. De acordo com uma pesquisa da Oppenheimer, os veículos elétricos e híbridos elétricos foram responsáveis por apenas 2,2% de todos os veículos americanos vendidos no último trimestre de 2019. E apenas um terço deles era puramente elétrico.

Mas isso está mudando rapidamente. Embora apenas 5,1 milhões de carros elétricos tenham sido vendidos em todo o mundo em 2018, esse número deverá aumentar ao longo da década - a previsão é que 21 milhões de unidades sejam vendidas em 2020, 98 milhões em 2025 e 253 milhões em 2030.

Construir um novo carro elétrico, no entanto, requer investir em pesquisas de ponta em componentes como baterias e grupos de transmissão. A única empresa que obteve sucesso remotamente é, obviamente, a Tesla - e até ela teve uma experiência difícil - contando também com os altos e baixos do gênio indomável de Elon Musk

Essa infusão inicial de capital - além de investimentos de quase US$ 500 milhões, incluindo a JIMCO, o braço de investimentos da Abdul Latif Jameel, uma empresa saudita que apostou muito em energia e mobilidade - deu à Rivian uma valuation ao redor de US $ 5,5 bilhões. Estima-se que Scaringe possua pouco mais de 20% da empresa, tornando-o no mais recente bilionário automotivo. O financiamento também permitiu que Scaringe quase triplicasse o tamanho da força de trabalho da Rivian, de cerca de 700 em 2018 para mais de 2.000 hoje, e é assim que ele pode escalar a produção este ano. 

"Quando terminarmos de limpar, pintar e instalar os equipamentos eventualmente seremos capazes de produzir 250.000 veículos por ano até meados da década." RJ não está no negócio para brincar, e já tem até encomendas que vai ter que entregar já em 2021: as vans de entrega da Amazon.

Encomenda certa, entrega (por enquanto) garantida

A empresa espera entregar 20.000 unidades em 2021 e 40.000 em 2022, o que pode resultar em aproximadamente US$ 1,4 bilhão e US$ 2,8 bilhões, respectivamente, se tudo correr conforme o planejado. Em comparação, a Tesla vendeu 25.000 unidades do Model X em 2016, seu primeiro ano completo de lançamento.

Além de seus dois primeiros lançamentos, RJ disse que haverá mais três veículos no portfólio Rivian até 2024. Embora ele seja cauteloso ao fornecer detalhes, Scaringe admite que um será menor em tamanho e todos serão consideravelmente mais baixos em preço. É uma estratégia semelhante à que a Land Rover faz com o Defender e os Range Rovers de primeira linha - ou seja, o mesmo modelo básico com menos luxo. E se Scaringe puder realmente manter o preço abaixo de US$ 50.000, causará dores de cabeça a Musk e seu Cybertruck.

Amazon e Cox: um belo começo e um parceiro de longo prazo

Para mim o grande trunfo inicial da Rivian é a parceria com a Amazon. A empresa de Jeff Bezos espera que a Rivian desenvolva uma van de entrega movida a bateria como parte de sua promessa de ser carbono zero em todos os seus negócios até 2040 e usar 100% de energia renovável para abastecer esses negócios até 2030. Numa das etapas para cumprir essa meta, a Amazon encomendou 100.000 vans à Rivian. Pelo menos 10.000 devem estar na estrada até o final de 2022 e todos deverão operar na frota da Amazon em 2024. Presumivelmente, as vans farão parte de uma rede logística de ponta a ponta na qual a Amazon trabalha desde 2015. Se isso se concretrizar, pode ter certeza que mais encomendas virão.

Se a parceria com a Amazon parece ser um bom concorrente da Tesla na parte de carros elétricos, a parceria com a Cox pode ser a mais preocupante para Musk. Embora a Tesla tenha mais de 100 centros de serviços em 30 estados, a Cox , somente em 2019, lidou com mais de 55 milhões de atendimentos automotivos em em sua ampla rede de centros comerciais e parceiros de revendedores nos Estados Unidos. Se algo der errado com um R1T ou R1S (nome, por enquanto, dos modelos que a Rivian vai vender no início), a idéia é que um cliente poderá levar o veículo a um centro de serviços para repará-lo rapidamente e com eficiência, algo com o qual a Tesla lutou desde a sua criação - e ainda não é eficiente. A Cox também está pensando em um relacionamento de longo prazo para ser um dos maiores players na venda de carros (novos e usados). Uma das empresas do grupo é a Kelley BLue Book, um sucesso nacional na precificação de carros usados mercado secundário. 

Normal: Mitsubishi se foi, Rivian chegou

A Revian pensou inclusive num ótimo lugar para colocar a fábrica, agregando o modo de vida de RJ com o que ele pensa da empresa: Normal, Illinois. A cidade de Normal tem pouco mais de 52 mil habitantes, e se fica a cerca de 100 milhas sudoeste de Chicago (a sede administrativa da Revian fica em Plymouth, Michigan).

A cidade de Normal abrigou uma fábrica da Mitsubishi, fechada em julho de 2015. Quando a fábrica fechou por lá o clima em Normal era decididamente fúnebre. "Doeu", disse o prefeito Chris Koos nessa entrevista a Forbes. "Isso deixou mais de mil pessoas desempregadas, o que causa um efeito cascata em toda a comunidade".

Mesmo depois que a planta foi vendida para a Rivian por US$ 16 milhões em 2017, os moradores continuaram céticos. Esse sentimento negativo logo mudou, no entanto. “Rivian mostrou interesse no estilo de vida da comunidade, na qualidade da educação, em moradias acessíveis e no acesso ao transporte”, disse o prefeito Koos. A empresa ainda teve uma reunião num dia em Normal, no último verão, para responder a perguntas de moradores locais. Isso causou um grande impacto na percepção de Rivian e, não surpreendentemente, provou ser valioso no recrutamento de funcionários.

Apple e Rivian: qualquer semelhança é mera coincidência

Para mim RJ lembra vagamente Steve Jobs na forma de início dos negócios - sei que terá muito fã da Apple falando que estou exagerando muito, mas vamos lá.

A Revian começou com um grupo de amigos apaixonados por carros, liderados pela ambição e força de vontade do jovem RJ, apaixonados por velocidade e aventura. "Aventura é vida", disse R.J. em uma outra entrevista mais antiga, também para a Forbes. “[Seu destino] pode ser pescar, jogar golfe, levar a família para almoçar.”

O caso de amor de Scaringe com "coisas que se movem", como ele diz, começou quando criança. Assim que ele tinha idade suficiente para lidar com ferramentas, ele ajudou um vizinho a reconstruir os Porsche 356s da sua garagem em Melbourne, Flórida. "O meu favorito era um Speedster do final dos anos 50", diz Scaringe. No colegial, ele ficou obcecado com a idéia de construir sua própria marca de automóveis e ganhou o conhecimento ao fazer seu doutorado em engenharia mecânica no prestigiado Sloan Automotive Lab do MIT, em Cambridge, Massachusetts. 

Enquanto estava no MIT, no entanto, ele entrou num certo conflito. “Foi frustrante saber que as coisas que eu amava eram simultaneamente as coisas que estavam deixando o ar mais sujo e causando todo tipo de problemas, desde conflitos geopolíticos a poluição atmosférica e mudanças climáticas”, disse Scaringe. Ele então mudou de rumo, decidindo se concentrar em veículos elétricos ecológicos.

Uma startup lenta no início, a Rivian foi fundada em 2009 e começou a desenvolver um cupê esportivo elétrico (a Tesla também teve esse começo, com o Roadster). Logo depois de alguns anos esse plano foi arquivado. "[Não estávamos] construindo algo que o mundo realmente precisava, que era diferente de outras coisas no mercado", diz ele.

Sem se deixar abalar, o jovem empreendedor mudou de direção mais uma vez, redefinindo a missão da empresa em relação ao futuro da mobilidade e focando em veículos utilitários de luxo. Qualquer semelhança com Steve Jobs não acho mera coincidência.

Então, por que levou quase uma década para produzir veículos? "[Temos] alinhado todas as peças", disse Scaringe. Isso consiste em desenvolver a tecnologia, montar um forte plano de negócios, construir a organização e estabelecer uma cadeia de suprimentos e um sistema de fabricação. Ele também passou anos construindo uma equipe de engenheiros e designers dos sonhos, incluindo Mark Vinnels, diretor executivo de engenharia da Rivian, que veio da McLaren (onde desenvolveu o desejado 720S e MP4-12C) e Jeff Hammoud, vice-presidente de design e veterano da Jeep, onde supervisionou o Grand Cherokee e o Wrangler.

A missão ao longo da vida de tornar a Rivian uma montadora de carros é uma realidade, e Scaringe acredita que suas prioridades como CEO incluem garantir que a direção da empresa seja clara, que a equipe certa esteja no lugar e que a cultura permita que as pessoas trabalhem sem silos ou burocracia . Mas se a pressão surgisse, o engenheiro do MIT preferiria estar no laboratório: "Gosto muito de trabalhar em nossa arquitetura de rede, pensando em nossa plataforma de skate." Em outras palavras, R.J. Scaringe apenas começou a colocar o bloco na rua. 

Musk e RJ: figuras opostas num mundo em transformação

Scaringe é de fala mansa e discreta. Enquanto Musk é fotografado com modelos e estrelas pop, Scaringe é um homem de família, mesmo que raramente veja sua família recentemente, por conta do trabalho. Atualmente, ele passando cinco dias por semana viajando entre os quatro escritórios da empresa para garantir que as coisas estejam dentro do prazo. Sua esposa, Meagan, e seus três filhos (todos com menos de 5 anos) o veem de sexta a domingo à noite em sua despretensiosa casa de três quartos perto de Irvine, Califórnia. Sua filosofia de vida é simples, visando repetir os processos para garantir que sua visão maior esteja sendo realizada: pensar globalmente e agir localmente. 

Só o fato de RJ não ficar falando aos 4 cantos do mundo que o importante é salvar o planeta já merece um grande destaque. Hoje em dia muita gente é veloz ao falar que devemos salvar o planeta, mas se bobear nem a cozinha da sua cas está arrumada corretamente. RJ vem transformando a visão que teve quando andava de skate na juventude em um negócio viável, tem grandes investidores por trás, e tem no trabalho em equipe sua principal arma para levar o sonho adiante.

Será mais um grande sucesso astronômico do mundo empresarial americano? Ainda temos muito tempo para saber essa resposta, mas o jovem RJ já começou certo. Musk não vai se preocupar agora com a Revian, mas no futuro pode ter certeza que a Revian e outros RJs estarão fazendo parte das reuniões de conselho da Tesla quando o assunto for a concorrência. Sempre saudável e necessária, por sinal.

 

 

 
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